Projeto EDA50 - escola à descoberta de abril- 50 anos -25 de abril

Resistir em Oeiras

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José Santos Coelho

(...) o poder político nunca veio falar connosco [militares] o que deu origem ao amadurecimento intelectual da nossa luta e acabou por desenrolar-se com o 25 de abril (...). (...) tínhamos consciência que ao prepararmos a operação “Viragem Histórica”, corríamos risco de vida (...). É o amor à Liberdade aquilo que vai garantir que possamos viver em paz e democracia (...).

José Santos Coelho

Yvonne Metello de Seixas 72 anos. Residente em Oeiras Como era a vida antes do 25 de abril? Antes do 25 de abril havia mais segurança, podia-se andar no meio da rua à noite e não havia tantos perigos. Mas também havia muitas restrições, as pessoas não podiam ter atividade política porque havia muita perseguição e não havia liberdade de expressão da maneira como há hoje em dia. Antes do 25 de abril imaginava que o regime político iria mudar? Não, não estava nada à espera. Como soube que estava a haver uma revolução? Se não me engano, penso que foi o meu namorado que me telefonou a contar. Viveu a revolução na rua ou em casa? Em casa. Qual foi a primeira mudança que sentiu? Houve uma grande mudança, a atividade política aumentou exponencialmente, começaram a surgir partidos políticos e um dinamismo político que não existia anteriormente.

A equipa do Projeto deixa o seu reconhecimento e agradecimento a todos os que possibilitaram&nbsp; a execução deste trabalho. Aos&nbsp; entrevistados: Aires Simões&nbsp; Aline Bettencourt&nbsp; Aurélio Farinha Aurora Rodrigues&nbsp; Eugénio Tavares Salgado&nbsp; Fernanda&nbsp;Santos Isabel Rasgado&nbsp; José Pedro Soares&nbsp; José Pessoa José Santos Coelho&nbsp; Maria de Fátima Farinha Maria Júlia Gomes dos Santos Pires&nbsp; Mário Pinto Pedro Mariano&nbsp; Teresa Pais Zambujo&nbsp;&nbsp; Yvonne Metello de Seixas&nbsp; Aos familiares e amigos dos elementos da equipa. Aos professores Jorge Neves e Manuel Barreto, pelo apoio técnico. À U.R.A.P (União dos Resistentes Antifascistas Portugueses). À Escola Secundária de Miraflores.

Aires Lopes Simões&nbsp; Como soube que estava a haver uma revolução?&nbsp; Nunca estive a par, nem a informação concreta de que haveria esta grande revolução.&nbsp;Foi algo inesperado.&nbsp;Ouvi depois no rádio e foi avisado por um amigo.&nbsp; Viveu a Revolução na rua ou em casa?&nbsp; A maior parte na rua, como muitos outros, a partir desse dia nunca mais houve sossego e sim muitas festas. Qual foi a primeira mudança que sentiu?&nbsp; De modo geral a liberdade e a democracia, foram tempos de muita euforia, excitação e novidade, ninguém, por uns tempos, queria saber de regras e regrinhas.&nbsp; Na sua opinião quem foram os heróis do 25 de abril?&nbsp; Particular relevância a Salgueiro Maia, um dos mais salientes e conhecidos, importante referir também a importância de Melo Antunes e muitos outros militares e organizadores, Mário Soares, Álvaro Cunhal e, no anonimato, todos aqueles que sofreram e lutaram. Em último, mas não menos importante, a resiliência, o sofrimento e a luta do povo português.&nbsp; Como foi o primeiro dia de trabalho?&nbsp; Pouco se trabalhou, euforia total, pouco trabalho e muita conversa.&nbsp; Caracterize a revolução em 4 palavras Entusiasmo;&nbsp;Surpresa;&nbsp;Democracia;&nbsp;Mudança.&nbsp; Entrevista realizada por: António Sá Rodrigues 4 de março de 2023

Fernanda Santos Como é que o governo se intrometia no seu trabalho?&nbsp; Tínhamos regras apertadas que tínhamos de seguir.&nbsp;Não se podia falar contra o governo, contra o regime, se não perdíamos logo o emprego.&nbsp;Desde que nos vestíssemos convenientemente e cumpríssemos as nossas funções. Se acabássemos as cartas da altura, os ofícios, com “a bem da Nação”, estava tudo bem. Antes dos "Melhores Cumprimentos, vinha “A bem da Nação”, e assinava-se. Desde que cumpríssemos essas regrazinhas, estava tudo bem. Referiu que foi professora. A matéria que ensinava aos alunos era de certa forma propagandista do Estado? Sim. Fui professora de Português. Lembro-me que a História ia até ao Estado Novo. Falava-se das maravilhas que o Estado Novo tinha feito. Enaltecia-se sempre todo o trabalho do Estado Novo. Estudavam-se as colónias&nbsp; Das linhas de caminho de ferro aos rios, aos afluentes dos rios, onde é que desaguavam.

Aires Lopes Simões&nbsp; 82 anos. Residente em Oeiras. Aires Lopes Simões, nasceu numa aldeia de nome Pipa a 17 de junho de 1941. Era uma aldeia de quintinhas, de estilo disseminado, onde compartilhou experiências com os seus amigos e vizinhos. A sua casa tinha vários animais e instalações agrícolas, incluindo fornos, moinhos, salgadeiras, estábulos e adegas. Tinha vários animais. Depois de trabalhar como empregado de escritório e de fazer o serviço militar em África, foi professor por dois anos.&nbsp;Mais tarde, ingressou numa companhia aérea. Em 1972, conheceu Maria Inácia e juntos criaram dois filhos, Tiago e Raquel. Agora aposentado é apaixonado por bricolage e pelos seus netos.&nbsp; Como era a vida antes do 25 de Abril?&nbsp; O que sentia mais era a falta de liberdade na ação e nos nossos pensamentos. Muito medo e perseguição daqueles que se manifestavam contra a censura.&nbsp;Autocensura, devido ao medo e aos diferentes preconceitos.&nbsp; Antes do 25 de Abril imaginava que o Regime ia mudar?&nbsp; Nunca, apesar de haver sempre alguma esperança graças aos diversos movimentos militares falhados e às poucas manifestações que já se viam.&nbsp;

Esta experiência enriquecedora proporcionou-me uma visão abrangente sobre o significado histórico e social desta Revolução, bem como sobre o legado duradouro que esta data representa para o nosso país. Ao mergulhar nas memórias e nas histórias daqueles que viveram e lutaram por esta conquista, pude compreender melhor a importância da liberdade, da democracia e dos direitos humanos.&nbsp; Uma das coisas que mais me impressionou durante este projeto foi a oportunidade de ouvir testemunhos emocionantes e perspicazes de pessoas que viveram de perto os eventos de 1974. &nbsp; As suas histórias cativaram-me profundamente e reforçaram a minha admiração pelas pessoas corajosas que ousaram desafiar um regime autoritário em busca de um futuro mais justo e livre. Por fim, mas não menos importante, gostaria de realçar o privilégio que senti ao poder contribuir para um projeto que celebrava a liberdade, a igualdade e a justiça. Cada momento investido nesta iniciativa única foi recompensador e reafirmou a minha convicção na importância de lutarmos diariamente para preservar e fortalecer os valores pelos quais tantos lutaram no passado. António Rodrigues&nbsp;

1.2 Testemunhos José Pedro Soares 73 anos. Ex-preso em Caxias. (…) a PIDE, assim que soube o meu nome, foi-me buscar. (&nbsp;…) estive três meses isolado ( …) não me deixavam dormir. Era outra forma de tortura…começaram a fazer-me perguntas e eu não respondi nada. (… ) seis dias e seis noites (…) vemos alucinações, via bichos (…) ouvia gritos, ouvia vozes que me eram familiares. (…) 21 dias na sala de interrogatórios (…) foi muito doloroso.

Fernanda Santos Começaram a introduzir-se coisas que antes não havia: Coca-Cola, McDonald’s. As meninas começaram a usar mini saia, calções, bikini na praia,&nbsp; a ler livros sem censura.&nbsp;Houve eleições livres (antes do 25 de abril eram manipuladas). O povo votou em massa. O 1º de maio foi uma festa linda, uma coisa muito genuína, muito verdadeira.&nbsp; Para si quem foram os grandes heróis do 25 de Abril?&nbsp; Na minha opinião, Otelo Saraiva de Carvalho, pode ter sido um estratega, mas não foi um herói.&nbsp; Foi o Salgueiro Maia, que comandou a acavalaria pesada de Santarém, aqui para Lisboa.&nbsp; Esteve no quartel do Carmo e conseguiu que o Américo Tomás e o Marcelo Caetano se rendessem. Posteriormente não foi reconhecido como merecia, só após a sua morte. Quais são as suas melhores memórias do 25 de Abril?&nbsp; Andei por todo o lado. O 1º de maio foi das melhores recordações com que fiquei.

Isabel Rasgado As reuniões de família passaram a ser agitadas, com discussões intermináveis sobre política e como o meu cunhado era de direita, o confronto de ideias instalava-se e o ambiente toldava-se completamente, não chegando à violência física, porque eram pessoas educadas.&nbsp; Perante esta realidade, eu achava que estávamos a evoluir para uma guerra civil. Simpatizava com o PS, mas era independente.&nbsp; Mais tarde, através de leituras, apercebi-me do papel que Mário Soares e Ramalho Eanes desempenharam nesses tempos conturbados, para o estabelecimento da democracia.&nbsp; Só eles conseguiram equilibrar o nosso País.&nbsp; Creio que, se o meu marido fosse vivo, ficaria muito desgostoso por assistir a momentos como os que hoje se vivem, no Mundo, no País e no Partido Socialista. O PS não é o mesmo partido em que o meu marido militou e acreditou. Creio que se ele fosse vivo, seria muito crítico relativamente à sua ação.&nbsp;&nbsp; Com o 25 de abril, a vida mudou, de facto.&nbsp;&nbsp; Na sua opinião, quem foram “Os Heróis” do 25 de abril?&nbsp; Os heróis do 25 de abril foram os capitães.

Isabel Rasgado Teve conhecimento que estava a decorrer uma revolução?&nbsp; Tive conhecimento, mas não me recordo bem como. O meu marido tinha ido ao banco. Os meus filhos eram pequenos e ficaram com a empregada. Eu fui com a minha mãe ao supermercado para nos abastecermos de bens essenciais, que, em nosso entender, podiam vir a faltar. Encontrámos muita gente no supermercado que, certamente com a mesma preocupação, tinha decidido abastecer-se de bens para poder enfrentar os próximos dias. Falavam sobre o Golpe de Estado que estava a decorrer e emitiam algumas opiniões.&nbsp; A participação de mulheres na Revolução, na sua ótica, foi significativa?&nbsp; Não. As mulheres estavam pouco informadas. Eu própria não gostava nem gosto de manifestações nem de confusões. Tinha de cumprir a minha missão na Escola de Alcoitão, que nunca fechou portas, tendo tido sempre a preocupação de prestar os serviços que me estavam cometidos e tinha o sentido dessa responsabilidade.&nbsp; No entanto, gerou-se um movimento anti diretor da escola, com vista ao seu saneamento, por ser médico e não fisioterapeuta. Os alunos defendiam a tese de que o diretor deveria ser alguém da profissão. Mais tarde, foi criado um Conselho Diretivo para gerir a Escola, no qual os alunos também eram ouvidos, através da Associação de Estudantes e os funcionários também tinham a sua representação. Cada curso ministrado na escola tinha um docente a representá-lo.

Maria Júlia dos Santos Pires&nbsp; 72 anos. Residente em Queijas. Como era a sua vida antes do 25 de abril?&nbsp; Trabalhando. Era técnica oficial de Contas, na área da contabilidade.&nbsp;A minha vida era sempre igual.&nbsp; Onde vivia antes do 25 de Abril?&nbsp; Vivia em Queijas.&nbsp; Antes da Revolução, achava que o regime ia mudar?&nbsp; Não esperava que fosse tão depressa, embora já tivesse assistido a várias manifestações de estudantes antes do 25 de Abril.&nbsp;Eu trabalhava na Praça do Chile e apanhei muitas vezes as enxurradas de estudantes que vinham do Técnico, pela Alameda abaixo, com os fulanos da PIDE a bater neles.&nbsp;Muitas das vezes, nós tínhamos de fechar os estabelecimentos quando as enxurradas aconteciam, ali ao lado da Portugália.&nbsp; Conheceu alguém que tivesse de fugir por causa do regime?&nbsp; Tive vários primos que foram para a França e Suíça. Não para fugirem ao regime, mas sim para fugirem ao Ultramar (Guerra Colonial).&nbsp;&nbsp;

Este projeto permitiu-nos conhecer melhor a vida antes e depois do 25 de abril. Aproveitámos os relatos de testemunhos muito interessantes. Nas entrevistas a essas pessoas, do nosso concelho, podemos obter outra visão, para além daquilo que as aulas nos proporcionam. &nbsp; Neste projeto gostei de trabalhar e fazer entrevistas, algo que nunca tinha feito antes. Penso que este tipo de trabalhos deveria repetir-se com outras turmas e anos, pois proporciona novas experiências que nos poderão ser úteis, num futuro próximo.&nbsp; Duarte Magro&nbsp;

Trabalhar neste projeto, e fazer parte do reavivar da memória de uma parte crucial na História de Portugal, que influencia diretamente a atualidade, foi muito cativante, interessante e sobretudo um privilégio. No decorrer do projeto tive a oportunidade de aprofundar conhecimentos em relação ao Estado Novo e como era ser contemporâneo nessa época através dos testemunhos nas variadas&nbsp;palestras e entrevistas. &nbsp; Participar neste projeto mostrou-me a importância de viver em democracia e também a gratidão que devemos ter para com os que lutaram para que atualmente&nbsp;possamos ser livres de pensar e viver sem opressão. Laura Fernandes

3. A libertação dos presos

Caxias, 27 de abril de 1974

Eu tinha a certeza que o Regime ia mudar (…) era impossível que aquilo continuasse!

Aurora Rodrigues

Isabel Rasgado Antes do 25 de abril, imaginava que o regime iria mudar?&nbsp; Não. Como em casa dos meus pais, não se discutia política e, já depois de casada, a política continuava a não ser assunto, não estava atenta ao que se passava a esse nível.&nbsp;Acresce o facto de o meu marido, apesar de ter feito a tropa, não ter sido mobilizado para o Ultramar. Creio que se tivesse participado na Guerra Colonial, as preocupações políticas teriam estado mais presentes na nossa vida. Julga que o facto de ter iniciado a sua carreira num período em que quase não possuía liberdades, influenciou a sua ascensão no mercado de trabalho?&nbsp; Nunca senti qualquer limitação no exercício da minha atividade profissional. Sentia-me livre quer na profissão quer na vida particular. Apenas me recordo da visita da PIDE a casa de um senhor que vivia perto de mim. A PIDE estava a tentar encontrar um irmão do senhor, que era opositor ao regime, e que tinha fugido para a Suécia.&nbsp;&nbsp; Considera que ser do sexo feminino influenciou negativamente a sua atividade diária?&nbsp; O facto de ser mulher em nada influenciou o desenvolvimento da minha carreira profissional. De referir que, em fisioterapia, havia poucos elementos masculinos.

2. Análise dos depoimentos

As Histórias de quem viveu antes, durante e após a revolução de abril, que este Projeto pretendeu dar a conhecer, centraram-se em pessoas cujas vivências decorreram no concelho de Oeiras: familiares, amigos, vizinhos e conhecidos dos elementos da equipa de trabalho, residentes em diferentes freguesias do concelho, com idades compreendidas entre os 68 e os 87 anos. Relatam como era viver no período ditatorial em Portugal, como foi o dia em que triunfou a revolução e como decorreu a vida no após 25 de abril. Ao longo das 15 entrevistas realizadas, vão-se resgatando memórias, de um período cinzento da nossa História, em que estes então jovens adultos, percebiam que “grassava o descontentamento entre as pessoas”, como refere um entrevistado, sentindo que faltava liberdade de ação e de pensamento e que viviam no medo de perseguições. Apesar de muitos deles não serem ativistas e de não intervirem diretamente em “assuntos relacionados com a política”, não eram alheios ao que os rodeava: o país estava fechado ao resto da Europa, havia miséria e fome, censura e repressão política.

José Pedro Soares

(..) aquilo que podemos fazer agora é ajudar a tornar mais forte a nossa democracia e contribuir para que estes perigos do fascismo não reapareçam.

José Pedro Soares

Yvonne Metello de Seixas Em relação&nbsp; à segurança, que referiu anteriormente, o que é que mudou? Houve uma alteração da atmosfera nas ruas? Sim, logo a seguir ao 25 de abril sentia-se que havia alguma agitação e desassossego, havia alguma agressividade no ar. Mas isso depois estabilizou passado um ano ou dois, quando o 25 de abril digamos que assentou. Na sua opinião, a revolução do 25 de abril foi necessária? Foi necessária e foi um acontecimento muito importante para Portugal. Portugal abriu as fronteiras, era um país que estava bastante fechado e nos anos após o 25 de abril abriu-se bastante à inovação. Esta inovação também se refletiu nos estudos superiores e houve muitas áreas que abriram portas ao desenvolvimento. E um aspeto que foi absolutamente fundamental e importante Portugal tornou-se uma democracia e aderiu a União Europeia. &nbsp; Entrevista realizada por: Laura Fernandes 15 de fevereiro de 2023

III.&nbsp;&nbsp; O concelho de Oeiras -&nbsp; breve caracterização 1.&nbsp; A prisão de Caxias

Oeiras 

Fernanda Santos Em que condições vivia antes do 25 de Abril?&nbsp; As condições eram normais, desde que uma pessoa não falasse em política.&nbsp; Antes da revolução, conhecia alguém que tinha fugido do país? Quer para fugir ao governo, ou para melhores condições?&nbsp; Quando rebentou a guerra colonial, muita rapaziada desertou, fugiu antes para não ser incorporada na tropa, porque não queriam ir para a guerra colonial.&nbsp;Houve muita gente que desertou, mesmo muita gente. Não estavam de acordo com o regime:&nbsp;Manuel Alegre, que fugiu primeiro para Paris e a seguir para a Argélia, trabalhou na rádio Argel, uma rádio que se ouvia aqui em Portugal, que era contra o regime.&nbsp;Foi escritor e político.&nbsp; Antes da revolução era livre para fazer o que quisesse? O que é que não podia fazer? Portugal era um país muito fechado, aliás, Salazar até tinha uma frase que era: “Orgulhosamente Sós”&nbsp;Eramos um país que estava fechado ao resto da Europa e do Mundo.&nbsp;Não havia liberdade de expressão.

Aline Almeida Bettencourt

Conheci as zonas mais pobres do concelho de Oeiras, principalmente Caxias (...) os bairros eram bairros de lata (...) a lata dos carros velhos e vivia-se assim, debaixo daquilo. ...ficar grávida na década de 60, sem o marido, que deixou a casa, (...) uma mulher fica marcada! Se o marido sai de casa é porque é uma mulher que se portou mal... Não há dúvida nenhuma que o poder autárquico foi uma das grandes conquistas do 25 de abril!

Aline Bettencourt

José Pessoa O processo do 25 de abril ao 25 de novembro foi uma epopeia, com coisas bem feitas, mal feitas, desbaratou-se a economia… Começou com um grupo de militares governado pelo General Eanes que desencadearam a ação militar necessária para repor a ordem. Lembra-se das eleições para a Assembleia Constituinte de 1975? Sim, em maio de 1975 houve eleições livres, para a Assembleia Constituinte e em 1976 foi instaurada a Constituição da República Portuguesa e foi eleito democraticamente, nas eleições legislativas, o primeiro governo. A abstenção foi mínima. As pessoas estavam sedentas de terem poder eleitoral. Houve votos por correspondência. Votei enquanto estava em Tancos. Entrevista realizada por Luís Vicente Maria Clara Lopes 19 de maio de 2023

Isabel Rasgado Eles entregaram-se de corpo e alma à causa. Eu estava na retaguarda, dedicando-me ao meu trabalho e à educação dos nossos filhos.&nbsp; O meu marido deixou de ter tempo para dedicar à família, dado estar absorvido pelos ideais partidários e pelas muitas tarefas que tinham de levar a cabo. Tinha uma grande admiração por Mário Soares. Muitas vezes, eu telefonava para o Partido, para perceber a razão de tanta ausência. Tal procedimento dava origem a discussões familiares, porque o foco do meu marido era o Partido.&nbsp; Só para se aperceberem da sua entrega, digo-vos que, na madrugada do 25 de novembro de 1975 (fim do PREC- Processo Revolucionário em Curso), estávamos a dormir e o telefone tocou. Eram três da manhã. O meu marido levantou-se, vestiu-se e saiu. Estive dois dias sem ter notícias e, quando finalmente regressou a casa apenas respondeu, quando questionado sobre o seu paradeiro, que esteve no Partido Socialista (PS). Creio que o trabalho desenvolvido quer por ele quer pelo amigo foi bastante apreciado e contribuiu certamente para o facto de terem sido convidados para desempenhar cargos importantes no primeiro Governo Constitucional, que tomou posse a 23 de julho de 1976, sob chefia de Mário Soares sendo constituído por elementos do PS, após ter obtido a maioria dos votos, nas eleições legislativas de 25 de abril de 1976.&nbsp;&nbsp;

Teresa Pais Zambujo &nbsp; O que é que sentiu na sociedade civil?&nbsp; Na sociedade civil, foram surgindo movimentos e partidos políticos, a maioria deles já existentes, mas na clandestinidade.&nbsp; Pessoalmente, senti necessidade de assistir a muitos sessões de ideologias diferentes, para me ir documentando. Tanto estive presente em comícios ditos de direita como de esquerda. Sempre ouvi todos, com atenção e sem precipitação.&nbsp; Vivia-se, na realidade, em liberdade. Podia-se livremente falar sobre tudo, emitir as mais diversas opiniões, sem estar com receio de o fazer.&nbsp;Acalmada a euforia do início, foi-se caminhando e tudo voltou a uma normalidade, agora diferente, porque livre.&nbsp; Foi-lhe fácil conseguir um emprego adequado à sua formação académica?&nbsp; Sim. Terminado o curso, ingressei, no dia seguinte, no mercado de trabalho, mais concretamente na Administração Central onde desenvolvi a minha carreira profissional, durante muitos anos. Sempre desempenhei as minhas funções junto de diversos Governos de diferentes cores políticas, com grande imparcialidade, nunca me permitindo trair as políticas definidas.&nbsp; Entrevista realizada por: Francisca Zambujo Abraão Madalena Zambujo Abraão 1 de maio de 2023.

Pedro Mariano 68 anos. Residente em Miraflores.

Foi jornalista da RTP durante mais de 30 anos, onde desempenhou diversas funções, tendo também sido correspondente da estação televisiva em Paris. Esteve envolvido nas primeiras reuniões de preparação do golpe militar, onde conheceu alguns dos capitães de abril. Forneceu-lhes dados que facilitaram a ocupação da RTP na madrugada do dia 25 de abril.

José Pessoa O que representou o 11 de março de 1975? No princípio de 1975, a face esquerdista do regime fez crer que iria haver uma matança na Páscoa, que pressupunha a eliminação de 1500 pessoas, ligadas à extrema direita. Por isso, numa nova tentativa de repor a Revolução dentro dos parênteses que o Movimento das Forças Armadas (MFA) tinha definido e sob orientação do general Spínola desencadearam-se ações militares que culminaram nos acontecimentos do 11 de março, levando o movimento revolucionário tender ainda mais para a esquerda. Desse acontecimento resultou a nacionalização da Banca, dos seguros e de várias empresas importantes na economia. O que foi o 25 de novembro de 1975? No 25 de novembro de 1975 a situação do país foi encaminhada para a atual. Reforçaram-se os princípios que levaram à Revolução pelo Movimento das Forças Armadas (MFA). O país estava a tornar-se o primeiro da Europa Ocidental de cariz comunista e terminou com um movimento militar para repor esses princípios que orientaram o Movimento das Forças Armadas (MFA).

Maria Júlia dos Santos Pires&nbsp; Conheceu alguém que tenha ido lutar para a guerra?&nbsp; O meu marido foi para o Ultramar. Esteve na Guiné e a seguir foi para Cabo Verde. Esteve lá durante 26 meses. Antes da revolução, era livre para fazer o que lhe apetecesse?&nbsp; Sim, relativamente. Não me metia em confusões, logo não tinha grandes problemas.&nbsp; Tinha noção da opinião das pessoas quanto à guerra?&nbsp; Sim, achavam que a guerra não tinha sentido porque realmente, no fim, perdemos tudo.&nbsp;Não mereceu o sacrifício, tanta gente a morrer e tantos que ainda hoje estão traumatizados e inutilizados.&nbsp; Quais foram as principais diferenças que notou quando o regime mudou? Liberdade a mais. Acho que foi de extremo a extremo.&nbsp; Não devia haver tanto facilitismo e tanta coisa para depois ao fim, ao fim ao cabo, o resto... pfft.&nbsp;A única vantagem, na minha opinião, foi a liberdade de expressão.&nbsp;

Era Um Redondo Vocábulo

Era um redondo vocábulo , in Venham mais cinco, José Afonso (1973). Canção escrita na prisão de Caxias.

(...) Vá camarada mais um passo que já uma estrela se levanta (...) in Hino de Caxias ( 1953/54)

Isabel Rasgado Dado que, tanto vivenciou uma altura em que as suas liberdades estavam suspensas, como conheceu outra faceta do mundo em que as possuía, confirma que a liberdade não nos foi concedida, mas sim, por nós encontrada, e por nós, tem de ser construída?&nbsp; Acho que a liberdade foi concedida, mas mal interpretada por alguns. Temos de a conservar e não retroceder. Existirão sempre pessoas e partidos que a querem boicotar. Em certas coisas, considero que temos liberdade a mais. É fundamental saber estar, respeitar, ter educação e saber fazer. As hierarquias têm de ser respeitadas.&nbsp;A Revolução aconteceu porque as pessoas estavam ansiosas pela mudança e motivadas para a concretizar.&nbsp; Entrevista realizada por: Francisca Zambujo Abraão Madalena Zambujo Abraão 28 de fevereiro de 2023&nbsp;&nbsp;

IV.&nbsp;&nbsp; Resistir em Oeiras - Histórias de vida 1. Entrevistas 1.1. Memórias Isabel Rasgado Idade 80 anos.&nbsp; Residente em Miraflores. Nasceu no seio de uma família socialmente bem posicionada, com pai médico, mãe dona de casa e com uma irmã. O pai não se interessava por política e, talvez por isso, não tivesse, durante a sua infância e adolescência, sido atraída para integrar qualquer movimento revolucionário de juventude, apesar de ter consciência da vivência política no país. O pai preenchia os seus tempos livres lendo livros, escrevendo e ouvindo música. Isabel iniciou o seu percurso profissional no Centro de Reabilitação de Alcoitão, onde permaneceu 6 meses, após o que se foi especializar nos Estados Unidos, durante um ano e meio, em plena Guerra do Vietname, tendo regressado a Alcoitão, em 1969.&nbsp;&nbsp; É fisioterapeuta de formação. Em 1969, foi convidada para lecionar na Escola Superior de Saúde de Alcoitão, onde permaneceu, como docente, até se aposentar em 2005. Ao mesmo tempo, exercia a sua atividade de prática clínica em espaço próprio. Levou uma vida normal de trabalho, sempre com muita ocupação. Foi Presidente da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas.&nbsp;

Aurélio Farinha e Maria de Fátima Farinha 74 anos e 73 anos. Residentes em Queijas.

Como era a vida antes do 25 de abril?&nbsp; Havia repressão, mas não tínhamos problemas. Não intervínhamos em assuntos relacionados com a política. A política da época resumia-se ao Salazarismo.&nbsp;&nbsp;Era horrível, os agentes da PIDE torturavam e matavam.&nbsp; Pensava-se que iria haver uma revolução?&nbsp; (Aurélio Farinha) Lá fora [em África] previa-se algo. As pessoas começaram a desistir dos seus investimentos, porque após a morte de Salazar começaram logo a pensar em entregar a províncias [ultramarinas].&nbsp; Participou na Guerra Colonial?&nbsp; (Aurélio Farinha) Sim, estive em Moçambique, em cidades como Nova Freixo e Vila Cabral (atual Lichinga).&nbsp; O que pensam da Guerra Colonial?&nbsp; Achamos que foi uma guerra inglória. Não deu em nada. Não teve quaisquer resultados, nem quaisquer benefícios.&nbsp;&nbsp;

José Pessoa Relativamente às Províncias Ultramarinas. Como foi o processo de independência? A Constituição de 1933 previa as Províncias Ultramarinas. A seguir à segunda Guerra Mundial apareceram movimentos de independência. Esses movimentos eram apoiados pela Checoslováquia, Rússia e China. Países como França e Inglaterra foram dando independência, mas mantiveram ligações. Já o Estado Novo entendia que o território português ia de Lisboa a Timor, não se tendo apercebido da mudança de rumo que conduziu à independência. Participou na Guerra Colonial? Não, estava a acabar a qualificação. Em que consistiu e o que pensa da Guerra Colonial? A Instituição Militar obedecia ao poder civil (Estado Novo) que empenhou as suas forças na Guerra Colonial. Teve uma duração de 13 anos na Guiné, Angola e Moçambique. As Forças Armadas tinham cerca de 300 000 militares, tendo conseguido aguentar a guerra com grande sacrifício da juventude da altura que ficou lá.

Fernanda Santos 74 anos. Residente em Queijas. Foi professora e secretária. Como era a vida antes do 25 de abril?&nbsp; Uma pessoa que andou a tirar um curso, estudou. A nível de política, ninguém queria ir dentro, pois não?&nbsp;Conseguia-se fazer uma vida normal, desde que se fosse a favor do Estado Novo e quem não concordava, o melhor era estar calado. Havia muita pobreza, gente muito pobre. Eu tinha 24 anos quando se deu o 25 de abril.&nbsp; Onde vivia antes do 25 de abril de 74? Eu nasci em Mangualde&nbsp;e fui estudar para a Universidade de Coimbra. Fui dar aulas para Ponte de Sor. Depois vim para Lisboa e vivi em Oeiras.&nbsp; Antes do 25 de Abril, achava que havia alguma chance de o regime mudar?&nbsp; Não, acho que não. Eu pelo menos não tinha essa ideia.&nbsp;Vivi no regime, devia haver essa esperança, mas não era uma coisa de que se falasse.&nbsp;Quando o Salazar morreu, não, antes de ele morrer, quando caiu da cadeira, quando veio o Marcelo Caetano, houve uma esperança de que houvesse uma abertura política, mas praticamente não se notou nada.&nbsp;

José Pessoa 73 anos. Residente em Algés. Foi piloto da força aérea e tenente-general. Onde vivia aquando da Revolução dos Cravos? Vivia na Base da Força Aérea, Base Aérea 1, em Sintra. Pensava-se que iria haver uma revolução? Já se sabia que iria acontecer. Houve uma ligeira abertura com o Marcelismo, mas apenas teórica. Os militares tinham alguma opinião acerca do governo Salazarista? Os militares tinham de manter uma posição neutral. A informação política estava integralmente escrita num “livrinho”. Quem falasse da política era preso. Os estudantes universitários só a partir de 1968 é que foram politizados. A Instituição Militar era um dos pilares da Nação. Quando um abana há problemas. Por isso, tinha de ser isenta. Onde passou o 25 de abril? A fazer a qualificação para piloto/ aviador. Quando soube que estava a decorrer um Golpe de Estado? Soube quando estava na base. Julgo que estive a voar nesse dia.

Histórias de quem viveu antes, durante e após a revolução de abril

VII. Bibliografia/Webgrafia

Elas estiveram nas prisões do fascismo (2022). Edição: URAP. 3ª edição.&nbsp; Os presos e as prisões políticas em Angra do Heroísmo (2022). 1933/1943. Edição: URAP. 1ª edição.&nbsp; Rodrigues, Aurora. (2022). Gente comum, uma história na PIDE. Parsifal: Lisboa. Varela, Raquel. (2019). A Revolução dos cravos em Oeiras. Parsifal :Lisboa.&nbsp; Figuras 1, 2 e 3 Consultado em 27 de junho de 2023, disponível em:&nbsp; <a href="https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+Caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;go=Ir&amp;uselang=pt&amp;type=image">https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+Caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;go=Ir&amp;uselang=pt&amp;type=image</a> Figuras 4 e 5 Consultado em 27 de junho de 2023, disponível em:&nbsp; <a href="https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+Caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;go=Ir&amp;uselang=pt&amp;type=image">https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+Caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;go=Ir&amp;uselang=pt&amp;type=image</a> Hino de Caxias Consultado em 29 de junho de 2023, disponível em:&nbsp;&nbsp; Depósito de Presos de Caxias&nbsp; Execução do Hino de Caxias: Coro da Achada, da Casa da Achada – Centro Mário Dionísio. (2019) <a href="https://memorial2019.org/node/26908">https://memorial2019.org/node/26908</a> <a href="https://www.veed.io/view/1d020fca-a82c-4d95-819e-48f777732b5b?panel=share">https://www.veed.io/view/1d020fca-a82c-4d95-819e-48f777732b5b?panel=share</a> Unsplash, por Jennifer Grismer&nbsp;<a href="https://unsplash.com/pt-br/fotografias/efY_VOhRprk">https://unsplash.com/pt-br/fotografias/efY_VOhRprk</a> Figuras 6, 7 e 8 &nbsp; Visão História, nº 71 junho 2022. Fotografia de Inácio Ludgero/Arquivo O Jornal. Consultado em 26 de junho de 2023, disponível em:&nbsp; <a href="https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+Caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;go=Ir&amp;uselang=pt&amp;type=image">https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+Caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;go=Ir&amp;uselang=pt&amp;type=image</a> Figuras 9, 10 e 11&nbsp; Consultado em 26 de junho de 2023, disponível em: <a href="https://visao.pt/visaojunior/noticias/2016-04-11-o-que-foi-o-25-de-abril-de-1974/">https://visao.pt/visaojunior/noticias/2016-04-11-o-que-foi-o-25-de-abril-de-1974/</a> Centro de documentação 25 de abril Consultado em 5 de julho, disponível em: <a href="https://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/DiariodeLisboa/1974/DiariodeLisboa_26Abr1974/DiariodeLisboa_26Abr1974_item1/index.html">https:</a><a href="https://www.juponline.pt/sociedade/artigo/35364/46-anos-liberdade-um-povo-ti-cidade.aspx">//www.juponline.pt/sociedade/artigo/35364/46-anos-liberdade-um-povo-ti-cidade.aspx</a> <a href="https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_das_For%C3%A7as_Armadas">https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_das_For%C3%A7as_Armadas</a>

Pedro Mariano Eu, na altura, já estava a colaborar na RTP e a ideia foi transmitir-lhes como podiam entrar (...) eu primeiro fiz um esquema (...) e depois levei lá o Capitão da Unidade do Exército, que era mesmo ali ao pé, Teófilo Bento.

Pedro Mariano

Os temas trabalhados, a pesquisa efetuada e a análise dos depoimentos dos entrevistados contribuíram para cimentar conhecimentos, assim como apreender outras realidades tão diferentes das dos nossos jovens. É evidente, na reflexão feita pelos alunos, que esta foi uma oportunidade ímpar de ouvir relatos tão emotivos quanto desconcertantes, na primeira pessoa, de quem ousou desafiar um regime autoritário e repressivo em busca de um futuro mais justo e livre. As histórias de vida, que foram partilhadas, constituíram um privilégio para os jovens entrevistadores, pois permitiram-lhes compreender melhor a importância dos valores conquistados com a revolução: a Liberdade, a Democracia e a defesa dos Direitos Humanos. Na bagagem de aprendizes, levarão consigo o eco das palavras ouvidas que permanecerão no horizonte.

VI. Este projeto para mim foi...

... muito interessante. O projeto permitiu a realização de um estudo detalhado acerca de um passado de repressão, ligado a um regime ditatorial, bem presente nas memórias dos nossos entrevistados. &nbsp; Foram desconcertantes alguns dos testemunhos ouvidos, marcados pelas emoções de quem contou uma parte importante e significativa da sua história de vida. Alguns, tão pormenorizados que quase nos colocam na pele de quem viveu o Estado Novo. Os temas tratados e os trabalhos realizados contribuíram para uma reconstituição clara da época da ditadura.&nbsp; Luís Maria Vicente&nbsp;

Não tendo vivenciado a Revolução de abril, considerámos que este Projeto nos obrigou a aprofundar o tema e a identificar as principais causas que motivaram o Golpe de Estado, bem como algumas das atrocidades cometidas durante o Estado Novo. As pesquisas efetuadas e os testemunhos que tivemos o privilégio de recolher, das pessoas entrevistadas, fizeram-nos refletir sobre a importância da Democracia. Francisca Zambujo Abraão&nbsp;&nbsp; Madalena Zambujo Abraão&nbsp;

Acha que o Estado Novo ainda influência a cultura de Portugal até hoje de alguma maneira?&nbsp; Há sempre os "saldozistas". Graça a Deus que já foi há muito tempo e a maior parte deles já morreram:&nbsp;Deus, Pátria e Família.&nbsp; Acho que não. A liberdade que ganhámos é tudo.&nbsp;Havia o que eu chamo “saldozistas”.&nbsp; O tempo da outra senhora, como se dizia. Quando Salazar morreu, fui fazer a minha primeira viagem à Alemanha. Eramos um grupo de estudantes universitários de comboio. Estávamos em Paris quando soubemos que o Salazar tinha morrido. Festejámos. Achámos que ia haver uma abertura. Veio Marcelo Caetano e ficou tudo na mesma. Quando caiu da cadeira (Salazar) – veio Marcelo Caetano.&nbsp; Chegámos a Hamburgo e estava à nossa espera um comité de estudantes alemães neonazis, com uma grande fotografia de Salazar. Iam dar-nos as boas vindas e apoiar a nossa estadia lá. Disseram: “Sabiam que o vosso grande líder Salazar morreu…”. Nós dissemos: “Já sabemos, festejámos em Paris”&nbsp;.O Comité Neonazi nunca mais apareceu.&nbsp; Entrevista realizada por: Duarte Magro Duarte Fernandes 18 de março de 2023

Mário Pinto 84 anos. Residente em Santo Amaro de Oeiras.

(...) os presos (de Caxias) estavam desconfiados, até porque tinham ouvido que quem estava à frente da operação era Spínola, senhor do Regime (...) não acreditavam na libertação (...) quando alguns eram para ser libertados, diziam assim: ou saímos todos ou não sai nenhum (...). (...) das melhores memórias (do 25 de Abril), foi Caxias, pois foi a principal participação e impacto que eu tive na revolução, ter a possibilidade de libertar homens, que fizeram tanto e sofreram, é gratificante (...).

Mário Pinto 

Projeto EDA50 - Escolas à Descoberta de Abril 50 anos Escola Secundária de Miraflores Ano letivo 2022-2023 Equipa do Projeto: Alunos do 9ºA António Rodrigues Madalena Zambujo Abraão Alunos do 9ºB Helena Chen Laura Fernandes Alunos do 9ºH Luís Vicente Maria Clara Lopes Alunos do 10ºH1 Duarte Fernandes Duarte Magro Francisca Zambujo Abraão Madalena Marçal Matilde Rodrigues Professoras Elsa Santos Lídia Lima Zelinda Baião

José Santos Coelho 78 anos. Residente em Oeiras.

Créditos: Presidência da República Portuguesa

Aderiu ao Movimento das Forças Armadas em 1973 e, com outros oficiais, formou o Núcleo de Informação e Organização deste Movimento. Planeou a emissão das senhas que deram início à operação Viragem Histórica, o golpe militar. Participou na ocupação do Rádio Clube Português. Em 2019, foi agraciado, pelo Presidente da República, com a Ordem da Liberdade, Grau Grande Oficial, pela prestimosa participação no 25 de abril de 1974.

Isabel Rasgado A participação de mulheres na Revolução, na sua ótica, foi significativa?&nbsp; Lutámos sempre, em conjunto com os alunos, para que o curso de Fisioterapia fosse reconhecido como curso superior e não apenas bacharelato. Tal pretensão foi conseguida, em 2000, quando se obteve o grau de licenciatura, para os alunos que cursavam Fisioterapia.&nbsp;&nbsp;&nbsp; Qual foi a primeira mudança que sentiu, após o 25 de abril?&nbsp; Foi a partir do dia 25 de abril de 1974, que a minha família e, em particular o meu marido, começou a procurar informação e a perceber o que verdadeiramente estava em causa. No dia 1 de maio de 1974, o meu marido foi com um amigo à manifestação do Dia do Trabalhador. Eu não quis participar, não me sentia confortável porque não estava esclarecida relativamente a alguns aspetos defendidos pelos capitães de abril.&nbsp; Quando da libertação dos presos políticos, eu, o meu marido e uns amigos fomos ao Estabelecimento Prisional de Caxias assistir ao acontecimento. Não me senti à vontade, mas achei que era um momento importante da nossa história.&nbsp; O meu marido, à medida que se ia documentando, ia tomando consciência da importância de participar ativamente no processo de desenvolvimento da Democracia, em Portugal.&nbsp;Posteriormente, o meu marido e um amigo próximo fizeram-se militantes do Partido Socialista (PS). Eu não me quis envolver.

Maria Júlia dos Santos Pires&nbsp; Qual era a sua opinião sobre o governo, antes da revolução?&nbsp; Acho que era um governo que pecava, porque eles deviam deixar as pessoas seguirem a ideologia delas e era o que não acontecia.&nbsp;Quem era contra o regime, estava tramado.&nbsp; Acha que a população de Oeiras concordava com o regime?&nbsp; Penso que era como o concelho de Lisboa, não houve grandes diferenças.&nbsp; Alguma vez interagiu ou conheceu algum agente da PIDE? Conheceu alguém que tenha sido preso pela PIDE?&nbsp; Não, não tive ninguém conhecido. Onde estava quando se deu o 25 de Abril?&nbsp; &nbsp;Estava em casa. Como é que soube do 25 de Abril?&nbsp; Pela Rádio. Eram 8 e pouco da manhã quando ligaram ao meu marido, um dos cobradores. Na altura ele já era chefe da Casa da Moeda, a perguntar se ia trabalhar. O meu marido perguntou: “Porque é que você não há-de ir trabalhar?”; “Então você não está a ouvir as notícias?”&nbsp;Quando nós ligámos a rádio, ouvimos que tinha havido um golpe de estado.&nbsp;

Eugénio Tavares Salgado 87 anos. Residente em Linda-a-Velha.

Quando veio o 25 de Abril fiquei surpreso por ter conseguido implantar-se como uma revolução que transformou completamente o nosso país. Tivemos um período de quase um ano com dificuldades mas que depois foram ultrapassadas com o 25 de novembro e a partir daí fomos recuperando a democracia que realmente estava no âmbito do 25 de abril.

1.1 A atuação da PIDE/DGS

A história do Estado Novo, a revolução de 25 de Abril de Abril de 1974 e as suas consequências são fundamentais para entender como o nosso país se encaixa no mundo de hoje e como podemos agir para que não cometamos os mesmos erros do passado.&nbsp; Graças a este projeto, tive a oportunidade de conhecer melhor os eventos que nos levaram até onde estamos agora, ganhei um melhor entendimento da vida de uma pessoa sob um regime autoritário, a violação da liberdade de expressão de um indivíduo, todos os horrores experienciados por aqueles que foram presos pelo regime e até mesmo, consegui compreender que é preciso ter coragem e fazer sacrifícios para lutar e preservar a nossa liberdade. &nbsp; Esta foi deveras uma experiência interessante, inesquecível e fomentou interesse meu quanto a esta época da história de Portugal e por isso acho que valeu a pena participar na mesma.&nbsp; Duarte Fernandes&nbsp;

A guerra colonial, “inglória,” e que sacrificou a juventude, está presente em grande parte dos discursos, provocando, simultaneamente, tristeza e revolta aos que a evocam. &nbsp;A maioria dos entrevistados tem estudos superiores pelo que, durante o período em que vigorou a ditadura, assistiu, nas faculdades, a manifestações de estudantes “sempre reprimidas pela polícia, com bastonadas, cavalos, tiros para o ar, balas de borracha” como confere um dos interlocutores. Ao mesmo tempo que estas situações têm lugar, o Regime efetua prisões. Dois dos entrevistados foram ex-presos políticos, em Caxias, e trouxeram consigo, preso na garganta, o lamento contido do tempo que passaram na prisão, do isolamento, dos interrogatórios e da tortura. Por seu turno, os militares entrevistados que, por inerência das suas funções deviam obedecer, estavam cientes de que “pôr fim ao Regime era um bem maior para o povo português”, como aponta um deles. O concelho de Oeiras é mencionado, por diversas vezes, pois aqui viviam muitos capitães de abril que pensaram o Golpe Militar. A prisão de Caxias é lembrada, também, por quem participou na libertação dos presos políticos, no dia 27 de abril: “ter a possibilidade de libertar homens que fizeram tanto e sofreram, é gratificante” afirma um dos intervenientes.

Figuras 12, 13 e 14&nbsp; Consultado em 27 de junho de 2023, disponível em:&nbsp; <a href="https://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/DiariodeLisboa/1974/DiariodeLisboa_26Abr1974/DiariodeLisboa_26Abr1974_item1/index.html">https://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/DiariodeLisboa/1974/DiariodeLisboa_26Abr1974/DiariodeLisboa_</a> <a href="https://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/DiariodeLisboa/1974/DiariodeLisboa_26Abr1974/DiariodeLisboa_26Abr1974_item1/index.html">26Abr1974_item1/index.html</a> <a href="https://www.flickr.com/creativecommons/">https://www.flickr.com/creativecommons/</a> <a href="https://silenciosememorias.blogspot.com/2019/04/2124-libertacao-dos-presos-politicos-de.html">https://silenciosememorias.blogspot.com/2019/04/2124-libertacao-dos-presos-politicos-de.html</a> Figuras 15 e 16&nbsp; Ata da libertação dos presos políticos de Caxias, cedida pela U.R.A.P (União dos Resistentes Antifascistas Portugueses). Fotos presentes no vídeo de Pedro Mariano Consultado em 12 de julho, disponível em: <a href="https://africainthephotobook.files.wordpress.com/2018/01/1966_mpla_dez_anos_20x14.jpg?w=1200">https://africainthephotobook.files.wordpress.com/2018/01/1966_mpla_dez_anos_20x14.jpg?w=1200</a> <a href="https://calisphere.org/crop/999x999/56b9ea3d85605277de90af4d83e99403">https://calisphere.org/crop/999x999/56b9ea3d85605277de90af4d83e99403</a> <a href="https://www.tchiweka.org/sites/default/files/styles/large_document/public/iconografia/image/0702.000.032.001.jpg?itok=0wDiabyS">https://www.tchiweka.org/sites/default/files/styles/large_document/public/iconografia/image/</a> <a href="https://www.tchiweka.org/sites/default/files/styles/large_document/public/iconografia/image/0702.000.032.001.jpg?itok=0wDiabyS">0702.000.032.001.jpg?itok=0wDiabyS</a> https://images.impresa.pt/expresso/2023-03-07-salgueiro-maia-7_T.jpg- 9788ba9c/1.91x1?wm=true&amp;amp;outputFormat=jpeg <a href="https://upload.wikimedia.org/wikipedia/pt/3/37/Aglomera%C3%A7%C3%A3o_Militar_e_Civil_durante_a_Crise_de_25_Novembro_1975_no_Rossio.jpg">https://upload.wikimedia.org/wikipedia/pt/3/37/Aglomera%C3%A7%C3%A3o_Militar_e_Civil_durante</a> <a href="https://upload.wikimedia.org/wikipedia/pt/3/37/Aglomera%C3%A7%C3%A3o_Militar_e_Civil_durante_a_Crise_de_25_Novembro_1975_no_Rossio.jpg">_a_Crise_de_25_Novembro_1975_no_Rossio.jpg</a> Música: Era um redondo vocábulo Consultado em 11 de julho de 2023, disponível em:&nbsp; https://youtu.be/DfPuxWNy_30 Fotos capa Consultado em 7 de julho de 2023, disponível em:&nbsp; <a href="https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;fulltext=Pesquisar+&amp;type=image">https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=pris%C3%A3o+de+caxias&amp;title=Special:MediaSearch&amp;fulltext=Pesquisar+&amp;type=image</a> <a href="https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=monumento+25+de+abril+oeiras&amp;title=Special:MediaSearch&amp;fulltext=Pesquisar+&amp;type=image">https://commons.wikimedia.org/w/index.php?search=monumento+25+de+abril+oeiras&amp;title=Special:MediaSearch&amp;fulltext=Pesquisar+&amp;type=image</a>

José Pessoa E em relação às pessoas vindas das províncias ultramarinas, apelidadas de “Retornados”. Havia algum preconceito com essas pessoas? Os Retornados são portugueses que a Revolução tratou mal. Grande ou maior parte deles nascidos lá e regressaram sem nada. Qual foi a principal mudança que se sentiu após a Revolução? A liberdade de expressão, de manifestação de ideias, sem coação pelo poder político. Em que consistiu a Manifestação de 28 de setembro de 1974, também conhecida como manifestação da Maioria Silenciosa? A seguir ao 25 de abril, as Forças Armadas foram influenciadas pelos partidos de esquerda e houve um grupo ligado ao Presidente da República, à época o general António Spínola, que entendia ter de se fazer uma alteração no caminho Marxista-Leninista que o país levava, devido à Revolução. Por isso, houve uma tentativa levada a cabo por esse grupo que visou alterar essa tendência de percurso que foi gorada e culminou na abdicação do Presidente da República.

2. A operação Fim de Regime

I. Introdução 1.&nbsp;Projeto EDA50 Com a aproximação da comemoração dos 50 anos do dia 25 de abril de 1974, multiplicam-se diversas iniciativas que pretendem marcar a data. O Conselho Nacional de Educação (CNE) desafiou 50 escolas, do continente e ilhas, a recolher testemunhos e memórias de quem viveu antes, durante e após este marco da nossa História. Assim, foi criado o Projeto Escolas à Descoberta de Abril&nbsp; 50 anos - 25 de Abril (EDA50) e a Escola Secundária de Miraflores foi uma das convidadas para o integrar. Formou-se uma equipa constituída por alunos das turmas 9ºA, B, H e 10ºH1 que trabalharam sob a orientação das respetivas professoras de História e da Professora Bibliotecária.

II.&nbsp; O Estado Novo 1.&nbsp; Os Meios de Repressão 1.1 &nbsp;&nbsp;A P.I.D.E 1.2&nbsp;&nbsp; A censura

Teresa Pais Zambujo&nbsp; A meio da tarde, eu, a minha mãe e duas primas decidimos ir até Cascais para distrair um pouco. Quando passávamos junto ao Forte da Giribita, vimos sair o Almirante Américo Tomás, até então Presidente da República, escoltado por alguns militares. Ficámos atónitas e sem vontade de prosseguir. Retornámos a casa e, frente ao televisor, assistimos ao desenvolvimento dos acontecimentos. Tudo pacífico e sem derrame de sangue. Questionava-me, se uma revolução era assim. Do que tinha estudado em História, não tinha ficado com essa ideia.&nbsp;&nbsp; Qual foi a principal mudança que sentiu após o 25 de abril de 1974?&nbsp; Todo o país se transformou numa grande festa, ruidosa e transbordante, e as pessoas deixaram sair livremente do coração todas as palavras e todos os sentimentos longamente acumulados durante os anos de ditadura.&nbsp;&nbsp;Na Faculdade, tudo mudou. Nos primeiros dias de aulas, após o 25 de abril, apenas a Revolução dos Cravos era tema. A liberdade dominava transversalmente as diferentes disciplinas. Os professores falavam abertamente e os estudantes pretendiam impor-se e fazer valer as suas pretensões. Começaram a surgir os embriões das Associações de Estudantes e, livremente, cada lista concorrente fazia a sua propaganda.&nbsp; Foram introduzidas novas disciplinas e matérias no currículo para que os alunos se pudessem documentar relativamente a diferentes ideologias políticas e, assim, optar por defender os seus ideais. Novos professores surgiram para lecionar as novas matérias, mais políticas.&nbsp;

Foi capitão-paraquedista em Angola. Esteve presente no dia 27 de abril de 1974, na prisão de Caxias, aquando da libertação dos presos. Em 2021, foi agraciado, pelo Presidente da República, com a Ordem da Liberdade, Grau de Grande Oficial, pela prestimosa participação no 25 de abril de 1974.

Aline Almeida Bettencourt 83 anos. Residente em Paço de Arcos.

Foi autarca no concelho de Oeiras entre 1976 e 1998, onde desempenhou diversos cargos ligados à administração local. Desenvolveu ações humanitárias em diversas áreas: cultural, social, educativa e saúde. Esteve  ligada ao Graal -  Movimento Internacional de Mulheres Cristãs.

Aurélio Farinha e Maria de Fátima Farinha

E em relação às pessoas vindas das províncias ultramarinas, apelidadas de “Retornados”. Havia algum preconceito com essas pessoas?&nbsp; Pensava-se que os “Retornados” vinham retirar o lugar a quem estava no país. Pensava-se que aqueles que tinham ido ganhar dinheiro lá para fora, vinham agora ocupar o lugar das pessoas que estiveram toda a vida no nosso país.&nbsp;Mas, houve muita gente que tinha tudo lá fora e voltou sem nada.&nbsp; Qual foi a principal mudança que se sentiu após a Revolução?&nbsp; A liberdade de expressão.&nbsp;A nível do quotidiano, o pós-revolução teve alguns problemas. Faltaram alimentos como o leite, o bacalhau, que era racionado e chamava-se ling. As batatas também faltaram…&nbsp;&nbsp; Entrevista realizada por: Luís Vicente Maria Clara Lopes 15 de maio de 2023

Fernanda Santos Onde é que estava quando o 25 de Abril aconteceu?&nbsp; Quando começou, estava a dormir. Começou à meia noite E depois do Adeus, de Paulo de Carvalho e Grândola Vila Morena, alguns minutos depois para as tropas saírem dos quarteis e avançarem sobre Lisboa.&nbsp;Quando acordei, às 7 da manhã, o rádio estava a dar marchas militares, coisa que não era comum.&nbsp;Ouvi uma declaração: “Aqui posto de comando das forças armadas, estamos a fazer uma revolução, um golpe de estado, aconselha-se a população a manter-se em casa”. Acordei o meu pai, disse que havia uma revolução, fomos os dois para a rua, ver como era a revolução, portanto, eu estava em Oeiras e fomos para Lisboa.&nbsp;Fomos para o Terreiro do Paço, estivemos no Carmo, onde o Marcelo Caetano e o Américo Tomás se refugiaram.&nbsp;Para onde iam as tropas, também íamos nós, para ver o que acontecia.&nbsp; Após a revolução, como é que a sua vida mudou?&nbsp; Mudou a sensação de liberdade, não ter medo que ao lado estivesse um PIDE(sco) que estivesse a ouvir.&nbsp; Portugal começou a abrir-se mais para o mundo, a ver as notícias do resto do mundo.&nbsp;Portugal foi muito falado em todo o mundo, como devem calcular.

I. Introdução 1. Projeto EDA50 1.1&nbsp;Projeto Resistir em Oeiras – Histórias de vida de&nbsp;antes, durante e após a revolução de abril 1.2&nbsp; Objetivos II.&nbsp;O Estado Novo 1. Os Meios de Repressão 1.1 A P.I.D.E 1.2&nbsp;A censura III.&nbsp;O concelho de Oeiras -&nbsp; breve caracterização 1. A prisão de Caxias 1.1 A atuação da PIDE/DGS 2. A Operação fim de regime 3. A libertação dos presos IV. Resistir em Oeiras - Histórias de vida. 1.&nbsp; Entrevistas 1.1 Memórias 1.2 Testemunhos 2. Análise dos depoimentos V. Este Projeto para mim foi... VI. Conclusão VII. Bibliografia/Webgrafia VIII. Agradecimentos

1.1&nbsp;&nbsp; Projeto Resistir em Oeiras – Histórias de vida de antes, durante e após a revolução de abril Iniciou-se este projeto com um enquadramento geral do período em que vigorou o Estado Novo, fazendo-se referência aos meios de repressão vigentes. De seguida, colocando o enfoque no concelho de Oeiras, fez-se uma breve caracterização centrada aos anos 60 e 70, com destaque para a prisão-hospital de Caxias. Aqui, não foi esquecida a canção de resistência Hino de Caxias, homenageando, desta forma, homens e mulheres que sofreram as agruras da prisão política. As memórias de vivências, e os testemunhos de resistência, dos que passaram por esta época tão marcante da História de Portugal, foram recolhidos através de entrevistas transcritas e gravadas (áudio e vídeo) a familiares, amigos, vizinhos e conhecidos que se disponibilizaram a contribuir para que as suas palavras perdurassem para memória futura.

Ata do dia da libertação dos presos  de Caxias. Contém uma lista de presos que saíram da prisão no dia 27 de abril de 1974.

Fernanda Santos As raparigas (principalmente) não se vestiam como queriam.&nbsp;Não se podia usar mini saia. Não se podia usar calções. Não se podia usar bikini, só fato de banho. Conheceu alguém que foi lutar para a guerra colonial?&nbsp; Na minha família, os meus primos todos foram, e a maior parte dos meus amigos também.&nbsp;Conheci dois que desertaram, fugiram para Paris.&nbsp; Antes do 25 de abril, teve algum contacto com algum agente da PIDE? Em que situação? E se sim, o que é que lhe fizeram?&nbsp; Fui presa pela PIDE na crise estudantil de 1969, em Coimbra. Numa cela com estudantes bêbados e prostitutas, tudo ao molho e fé em Deus. Para além disso, conhece alguém que tenha sido preso pela PIDE? Colegas meus estiveram presos aqui em Caxias, estiveram lá ainda uns mesitos.&nbsp;Foram presos numa grande manifestação que houve no funeral de um rapaz chamado Ribeiro dos Santos, no largo de Santos. Não se provou nada contra eles e acabaram por ser libertados.&nbsp; Antes da Revolução, qual era a sua opinião sobre o regime?&nbsp; Negativa, não gostava do governo. Não gostava de ler livros censurados&nbsp;. A televisão tinha um canal único, a RTP1. As notícias do estrangeiro, era tudo manipulado; filmes censurados, passavam de uma cena para a outra, só diziam o que agradava ao regime.&nbsp;

Teresa Pais Zambujo&nbsp; 69 anos, residente em Miraflores. Nasceu a 13 de novembro de 1953, em Lisboa, no seio de uma família tradicional portuguesa, filha de pai empresário e de mãe dedicada aos afazeres domésticos.&nbsp; Economista de formação académica, com uma vida profissional muito intensa e diversificada. Casada, mãe de duas filhas e avó de quatro netos.&nbsp; Como era a sua vida antes do 25 de abril? Quando ocorreu o 25 de abril de 1974, frequentava o 2º ano da faculdade. De política pouco se podia falar e também não se dispunha de informação suficiente para justificar eventuais discordâncias relativamente ao regime vigente.&nbsp;Lembro-me de, no meu primeiro ano da faculdade, ver na Cidade Universitária algumas figuras que observavam, atentamente, os movimentos de estudantes.&nbsp; Por no meu nome (Teresa Maria da Silva Pais Zambujo) ter, como apelidos, “Silva Pais” houve uma tentativa, por parte de um “piquete de alunos”, que nem pertenciam à minha Faculdade, de me impedirem de realizar uma prova de avaliação, nessa altura designada por “frequência”, mas rapidamente perceberam que nada tinha a ver com o chefe da PIDE, Silva Pais. Foi um episódio isolado que não se voltou a repetir.&nbsp;

1.2&nbsp;&nbsp; Objetivos Com este Projeto, pretendeu-se: • Comemorar os 50 anos do dia 25 de abril de 1974; • Contribuir para o acervo de memória futura do 25 de abril; • Aprofundar conhecimentos sobre&nbsp; a História nacional (Estado Novo e Revolução de abril); • Mobilizar valores de cidadania e participação; • Fomentar o trabalho colaborativo; • Contribuir para o desenvolvimento pessoal e a&nbsp; autonomia; • Desenvolver competências associadas ao pensamento crítico; • Desenvolver competências nas áreas da informação e comunicação; • Recolher testemunhos e memórias de quem viveu esta época no concelho de Oeiras; • Propiciar encontros intergeracionais como móbil para a aprendizagem.

Quando questionados sobre as memórias do dia em que se deu a Revolução, de um modo geral, a recordação é de um dia de festa em que “as pessoas deixaram sair livremente do coração todas as palavras e todos os sentimentos longamente acumulados”, nas palavras de uma das entrevistadas. Hoje, passados quase 50 anos do dia da operação Viragem Histórica, estes residentes em Oeiras são unânimes em usar as palavras Liberdade e Democracia como apanágio para falar do povo de um país que deve olhar para o futuro sem, contudo, olvidar o seu passado.

O Projeto iniciou-se com um enquadramento geral do período em que vigorou o Estado Novo, por se considerar pertinente explicitar este período histórico. Por estarmos num concelho onde, por um lado, muitos dos capitães de abril pensaram o Golpe Militar e, por outro, se localizar Caxias, um marco da repressão, a temática selecionada incidiu na recolha de memórias e testemunhos das vivências neste local. Os entrevistados relataram a sua vida no período ditatorial em Portugal, do dia em que triunfou a revolução e de como decorreu a vida no após 25 de abril. Foi uma ocasião para os alunos experienciarem, pela primeira vez, um modelo de abordagem baseado em entrevistas que propiciaram encontros intergeracionais aliciantes, descontraídos e de grande riqueza cultural. Estes encontros, que se desenrolaram em lugares tão diversos como a escola, o mercado ou a casa dos próprios entrevistados, promoveram valores de partilha e consciencialização do outro, tão importantes para o exercício de uma cidadania plena e ativa. Recolheu-se, assim, informação que permitiu mobilizar e aprofundar conhecimentos de modo a obter-se uma perspetiva comparativa dos três períodos em estudo.

Teresa Pais Zambujo&nbsp; Percebia perfeitamente que grassava o descontentamento entre as pessoas, que vivíamos uma ditadura, mas a prudência aconselhava contenção e aprofundamento da matéria. A vivência, até ao momento, não permitia aduzir argumentos e consolidar opiniões. Por ser muito nova, por ser rapariga e, como tal, sem ter de cumprir o serviço militar nas nossas colónias, que ceifava vidas, e por não me ter apercebido de que alguém, na minha família, tinha sofrido, na pele, o efeito das mobilizações para o Ultramar, não vivi intensamente esses momentos. A minha preocupação estava centrada em ter sucesso nos estudos. Como teve conhecimento de que o 25 de abril estava a acontecer?&nbsp;&nbsp;&nbsp; Tive conhecimento de que estava a ocorrer um Golpe de Estado através de um telefonema de uma colega e amiga, cujo pai era oficial do Exército e que, por isso, estava a acompanhar todo o processo.&nbsp; Ela referiu-me que, segundo o pai, seria conveniente não sair de casa e estar atenta às notícias. Fiquei expectante e não mais desliguei a televisão. A confusão estava instalada. Muitos elementos das Forças Armadas, carros de combate, armas em punho,&nbsp; mas, em simultâneo, muita gente anónima nas ruas que, tendo estampado no rosto o receio de uma operação mal sucedida, irradiava felicidade e distribuía cravos. O ambiente era inédito. Não estava a compreender muito bem como ia evoluir a situação.&nbsp;

Obra do escultor Sérgio Vicente, evocando a libertação dos presos políticos de Caxias. Lembra uma chama - a chama da liberdade. Foi erigida no local em que os familiares e visitas dos presos eram esperados pela PIDE. Inaugurada em 10/6/2010.&nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp;&nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp; &nbsp;&nbsp;

Maria Júlia dos Santos Pires&nbsp; Para si, o que é que mudou depois do regime?&nbsp; Nada. Continuei a fazer a vida que fazia.&nbsp; Acha que a vida das pessoas, em Portugal, melhorou após a revolução?&nbsp; Para algumas sim. Para outras acho que houve uma liberdade muito grande com a qual as pessoas criaram hábitos, que na minha opinião, não deviam ter acontecido. Esses hábitos não vingaram pois a vida não se proporcionou tão risonha como se previa. Acho que não devia ter havido tanta liberdade Para si, quem foram os grandes heróis do 25 de Abril?&nbsp; Para mim foram o Salgueiro Maia e os militares.&nbsp;Para mim, o Salgueiro Maia é o ídolo. Acho que o país está em dívida para com ele.&nbsp; Mencionou que após a revolução havia demasiada liberdade, pode exemplificar de que maneira?&nbsp; Greves, ocupação de casas.&nbsp;Montes de disparates que não havia razão de existirem. Quais são as suas melhores memórias do 25 de Abril?&nbsp; O facto de ter liberdade de expressão.&nbsp;Não ter de fechar as portas do estabelecimento por causa dos bandidos (PIDE) que vinham por ali abaixo a bater em estudantes.&nbsp; &nbsp; Entrevista realizada por: Duarte Magro e Duarte Fernandes 18 de março de 2023

Aurora Rodrigues 71 anos. Ex-presa em Caxias.

(...) os calmantes destinavam-se a quebrar a vontade das pessoas (…) quando a guarda me ia dar os calmantes, eu metia-os na bochecha e quando ela saía, cuspia-os.

Uma das formas de me manterem acordada era sacudirem-me, baterem com moedas em cima da mesa… era um estrondo com moedas, com chaves.

(…) a certa altura, passaram a fazer-me a asfixia da água e a meter-me a cabeça dentro de água.

(...) eu queria desmaiar para me tirarem dali, mas morrer não. Nunca quis morrer.

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